Em sete meses, foram concedidos 108.263 benefícios por incapacidade temporária; para especialista William Sanches, neurociência comportamental pode ser útil para transtornos mentais
“A retomada da atividade econômica trouxe esperança às pessoas, o que é positivo, já que o ânimo provoca no cérebro um estado de prazer e força para continuar”
O número de concessões de auxílio-doença para doenças psicológicas cresceu durante a pandemia de Covid-19, conforme informações divulgadas pelo Ministério do Trabalho e Previdência. Segundo o órgão, de janeiro a julho de 2021 foram concedidos 108.263 benefícios por incapacidade temporária – antigo auxílio-doença – para trabalhadores com transtornos mentais e comportamentais.
Ainda segundo os dados, transtornos como ansiedade, bipolaridade, depressão, esquizofrenia, estresse pós-traumático, fobia social e pânico fazem parte do grupo composto por 468 doenças prevalentes.
Como um dos transtornos mais recorrentes, a ansiedade afeta cerca de 18,6 milhões de brasileiros, de acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde). Aliás, foram 53 milhões de novos casos de depressão e 76 milhões de ansiedade em todo o mundo em 2020 – primeiro ano de pandemia -, segundo pesquisa publicada no periódico científico The Lancet em outubro do último ano.
Paralelamente, um balanço da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), realizado em 2020, demonstra que 67,8% dos associados receberam pacientes novos no início da crise sanitária que, até então, nunca haviam apresentado sintomas psiquiátricos.
Para o terapeuta William Sanches, os números demonstram que a crise sanitária representou um forte impacto emocional para os brasileiros, provocando a sensação de desestabilidade. “Boa parte das pessoas passam a vida buscando estabilidade porque o desconhecido e a falta de segurança as atormenta. Assim, diante de uma situação de pandemia, muitos se veem sem qualquer possibilidade de segurança”, afirma.
Ainda assim, prossegue, é possível observar o cenário pelo seguinte viés: muita gente descobriu terapia, buscou ajuda, passou a meditar, procurou ler mais ou ingressou em lives sobre a pauta. “Todo tipo de situação nos ensina, é preciso escolher a postura que vamos adotar. A retomada da atividade econômica trouxe esperança às pessoas, o que é positivo, já que o ânimo provoca no cérebro um estado de prazer e força para continuar”.
Neurociência comportamental pode ser útil para transtornos mentais
Na concepção de William Sanches, a neurociência comportamental pode ajudar no tratamento de transtornos mentais, como ansiedade e depressão.
“O controle do nosso comportamento é o bem mais precioso que podemos ter em períodos de grandes desafios. Não deixar que o externo atrapalhe nossa vida interna é importante para garantir o bem-estar em momentos adversos”, acredita. “Nosso sistema nervoso intriga muita gente, principalmente o funcionamento do cérebro, que esconde diversos mistérios. Muito se fala disso, mas pouco realmente se aplica no dia a dia das pessoas”.
Para o especialista, neste ponto entra a neurociência – estudo científico do sistema nervoso – que deve ser descomplicada. “Quanto mais claro e fácil for o assunto, melhor as pessoas podem compreender o poder que possuem: pessoas ansiosas podem, de forma consciente, alterar sua respiração e diminuir os níveis de ansiedade, por exemplo”, explica. “Ninguém precisa ser um especialista em neurociências e comportamento para entender um pouco de positividade para enfrentar os desafios emocionais a que todos somos expostos, todos os dias. Quanto mais conhecimento, melhor podemos sair de situações difíceis”.
William Sanches acredita que uma atitude mental positiva também pode contribuir para a busca por um estilo de vida saudável, com boa alimentação e prática esportiva. “Como diz o ditado, ‘mente sã, corpo são’: a prática de atividade física regular diminui o risco de ansiedade em cerca de 60%”, reporta, em referência a um estudo dos cientistas do Departamento de Ciências Médicas Experimentais da Universidade de Lund, na Suécia. A sondagem da Frontiers in Psychiatry considerou informações de cerca de 400 mil indivíduos.
Por fim, o terapeuta destaca que momentos desafiadores – como o surgimento de síndromes gripais e novas variantes – exigem otimismo e criatividade. “A desesperança é cruel para o cérebro humano. Pessoas desestimuladas, acuadas e com medo, deixam de criar, de produzir e de acreditar em si mesmas. Por outro lado, explorar o seu potencial máximo, por meio da neurociência, pode ajudar a enfrentar os desafios de um novo tempo em uma realidade pós-pandemia”.